26/120 - Alm'inha

 Ah, minha adorada...


Encontramo-nos em um dia de abril naquela cidade clara dos montes de mel. Quase não te aceitei, tive medo: grande responsabilidade. Logo esse receio foi desfeito pelo médico dos animais. Você encheu a minha vida de ternura e beleza. Foi minha companhia nos momentos mais solitários e se aconchegava em mim todas as noites. Nunca me deixava fechar uma porta, sempre estava lá chorando querendo entrar. Anunciava a minha chegada à distância e sempre me recebia com aquele carinho e saudação sonora. Eu fui sua amiga, mãe, filha... Aqueles anos tão difíceis, foi você quem me ajudou a atravessar. Mas eu sei que errei contigo, me perdoe. Agora também carrego essa dor que faz buraco no meu coração. Mas olha, na minha mente existe um mundo. Um conto de fadas no qual reina a natureza, a arte e o amor. Nesse lugar eu te vejo na cadeira de escritório em pose de esfinge, na janela olhando para a rua, ouvindo música clássica com devoção, cheirando as flores, tomando um solzinho toda enroladinha, no meio de um livro que eu acabei de abrir, desfilando no piano e na vela ao anoitecer. Ah, minha querida, alm’inha adorada, descanse no seio do manancial da vida. Quem sabe os planos do criativo? Você se foi e outro ser chegou, tudo isso em junho, marcado pelo ipê rosa. O golpe da sua perda foi duro e inesperado, mas eu não te tenho um amor-apego. Eu te tenho um amor-liberdade e te deixo ir. Até o choro da sua partida foi iluminado pelos buquês cor-de-rosa, a cor da ternura que sinto por você. Nessa harmonia tão síncrona, mesmo as lágrimas de tristeza são frescas e irrigam os rios de beleza que tenho dentro de mim. Obrigada por esses 7, quase 9 anos. Apesar do pouco tempo, nossa relação foi de uma profundidade tão intensa que te trouxe para o meu ser. Quem sabe um dia eu consiga sentir os outros do mesmo modo. Nosso elo permanece nas minhas lembranças, no meu sonho e em tudo de sublime que me for aqui permitido ainda viver.