22/120 - NOS
Era uma caixinha de música muito estranha...
Não havia uma bailarina
rodopiando continuamente.
Mas tinha dois robozinhos
incansáveis em busca da perfeição, talvez da felicidade.
Todo dia era a mesma coisa:
acordar com o nascer do sol – a luz que vinha de fora aquecia suas engrenagens;
lubrificar seus corpinhos – era preciso cuidar para não desgastar; limpar seu pequeno
espaço com muito cuidado – o chão se sentia acariciado, as louças e talheres
ficavam brilhando, o banheiro perfumado, os vincos das roupas de cama ajeitados...
era uma delícia pertencer àquelas adoráveis criaturinhas, que com tanto esmero
mantinham toda a estrutura funcionando.
Uma atividade muito importante
era sair em busca do sustento. Precisavam se afastar da caixinha por algumas
horas para manter sua rotina de forma agradável. Às vezes esse tempo era
cansativo: encontravam outros robozinhos irritados, desorganizados, infelizes
que se esforçavam por deixar a vida de outros companheiros também chata, assim
como eles sentiam a sua existência. Um detalhe fazia toda a diferença: sabiam
que tinham um ao outro. Assim, enfrentavam todas as adversidades com a certeza
de que ao final do dia, tudo se converteria em amor. Era realmente uma vontade
poderosa de alcançar o objetivo de seu criador. Muitas vezes falhavam, quebrava
alguma peça, outros bonequinhos tentavam atrapalhar a rotina deles. Os dois nem
prestavam assunto, a razão de tudo estava em sua união. O essencial era fechar
o dia – mais um presente da eternidade – com o calor que ambos se transmitiam.
Era um mundo tão encantado.
Dentro e fora da caixinha. Tanto que eles sentiam o maior prazer em repetir
sempre e uma vez mais o mesmo ritual. E havia outras possibilidades. De vez em
quando eles sonhavam, com a sensatez de que tudo seria bom se
mantivessem o nós bem apertado. E a prudência de reconhecer quanta riqueza já
tinham. Que generoso foi esse demiurgo que os imaginou para uma vida tão bela.
Na verdade, eles sofreram um bocado até perceberem que não era muito complicado
viver em paz. Com um pouco da inteligência que lhes foi dada, logo perceberam
saídas criativas para certas situações. E com a leveza de quem sabe o quer, dançavam
em harmonia para mais um dia feliz, ao som da música universal.